Esse blog foi criado pelos alunos do professor Ricardo para divulgar os rascunhos literários.
Se desejar fazer parte, deixe uma mensagem com um exemplo do seu texto.
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domingo, 27 de junho de 2010

Analgésico - Alvaro Freitas

Tem coisas que quero, mas não tenho.
Tem coisas que tenho, mas não quero.
Não quero tremer, nem sofrer.
Não quero chorar, nem viver.

Se a justiça só me serve,
pra tolher a liberdade.
Quero então uma injustiça,
que me tenha piedade.

Se pelos crimes do inimigo,
tenho que ser acusado.
Preferia ter cometido os meus próprios,
pra não ser injustiçado.

Se a mentira do opressor,
vale mais do que a verdade.
Quero uma boa ficção,
pra evitar desigualdade.

Se não tenho uma amante,
que com carinho me toque a pele.
Quero ao menos um legista,
que com atenção me desmantele.

Se não tenho um bom Amigo,
que me ouça o lamento.
Quero ao menos um punhal,
que me tire o sofrimento.

Se não tenho um amor,
que me leve ao paraíso.
Quero então uma demência,
que me arruíne o juízo.

Se a doença que eu tenho,
não pode ser medicada.
Preferiria uma hemorragia,
que pudesse ser estancada.

Se não tem um analgésico,
que alivie a minha dor.
Quero então um precipício,
que me faça esse favor. 

quarta-feira, 23 de junho de 2010

A Maldição de Barbosa

Ah! Nada como sentir essa brisa que vem do mar.
Ele estava sentado num banco do jardim da praia, distraido olhando para o mar e apreciando as crianças brincar na água. De repente ela surgiu trazendo o menino pela mão. Parou à frente dele e com voz grave e olhar de acusação disse.
-Filho! Este homem fez o Brasil inteiro chorar de tristeza.
Ele demorou alguns segundos para perceber que era com ele. Virou o rosto e olhou para ela que continuava com aquele olhar duro, de reprovação. Engoliu em seco e seu olhar de desanimo mostrava a amargura em seu coração. Preferiu o silencio, pois sabia que qualquer coisa que dissesse não ia mudar o pensamento dela. Ele era culpado e pronto!
A criança olhou para ele e depois para ela sem entender nada. Ela não se compadeceu e do mesmo jeito que chegou, saiu conduzindo seu filho.
Aquilo se tornara comum em sua vida. Por mais distante que fosse, não havia como fugir.
-Nunca vou conseguir me livrar disso. Parece que carrego uma maldição. Ele chorava em silêncio e um sentimento de revolta dominou seu corpo: sentiu vontade de gritar para o mundo.
-Eu não joguei sozinhooooooo. Havia mais dez além de mimmm.
Mas, sabia que não adiantava. Tinha sido julgado e condenado pela derrota do Brasil em 1950 e só a morte ia conseguir libertá-lo disso.
Com os cotovelos apoiados nos joelhos, colocou as duas mãos na cabeça. Era como se quizesse tirar tudo aquilo da mente, enquanto as lagrimas escorriam pelo rosto.
-Por que cometem essa injustiça comigo?
Eu era apenas mais um defensor daquela seleção. Ninguém lembra dos outros dez, somente eu sou lembrado. Um individuo mata outro, é julgado e condenado a 30 anos de cadeia. Depois desse tempo está livre e pagou pelo seu erro. Eu não!
Já se passaram mais de 50 anos e eu continuo pagando por um crime que não cometi.
-Perdemos, eu sei. Mas, e daí?
Já perdemos tantas outras copas por erros de jogador ou de técnico, mas ninguém lembra mais disso. Por que não esquecem de mim? Sai do Rio de Janeiro por que não aguentava mais. Vim morar aqui na Praia grande, onde pensei que encontraria a paz, mas não.
E a imprensa então! Toda vez que o Brasil joga com o Uruguai sou lembrado, não pelas defesas que fiz, mas por um gol que tomei. Um gol normal, indefensavel para qualquer goleiro. Menos para mim. E valorizam o atacante uruguaio que fez o gol. Ele sim foi nosso carrasco, não eu.
Depois de ouvir as palavras duras daquela mulher, Barbosa perdeu a vontade de ficar ali. Mais uma vez, alguém tinha estragado seu dia. O pior era o olhar daquela criança, que vai crescer e será mais um para condena-lo. A idade também já pesava em seus ombros e saiu caminhando devagar de volta para casa, pensando. Pelo menos lá não tem ninguém para me condenar, pois moro sozinho.
Um dia Barbosa foi retirado de nosso convivio, mas não se libertou. Mesmo morto, ainda paga pela perda do titulo. Foi um injustiçado, por isso devemos pelo menos reverenciar a memória do cidadão. Uma pessoa correta, amigo de todos e acima de tudo um homem integro. E que mesmo sendo agredido, nunca revidou os ataques contra ele. Acho que já passou da hora de apagar esse estigma da vida de Barbosa e lembrar somente do grande homem que foi.
É muito facil julgar os outros e acusa-los de erros. O dificil é criar consciência que essa atitude lembrada sempre, não trouxe nenhum beneficio para os brasileiros, mas conseguiu destruir a vida desse pobre cidadão chamado Barbosa.
JAF-Falcão Peregrino

sábado, 19 de junho de 2010

Máscara - Alvaro Freitas

Que gracinha, é a cara da mãe!
Carente, assustado e indefeso,
Estranho em um mundo estranho.
Achando ter escapado ileso,
Foi levado ao primeiro banho.

Menino, veste uma calça!
No calor intenso do verão,
Brincando todo empolgado,
Aprendeu uma boa lição,
Que não devia andar pelado.

Você tem que ouvir os mais velhos!
Tanta coisa a aprender,
E tão pouco a ensinar.
Como os velhos, há de ser.
E seu instinto ocultar.

Fala que nem homem, moleque!
Com a voz desafinada,
E a carinha de criança,
Fez uma voz disfarçada,
Pra merecer confiança.

Pra ocultar tantos defeitos.
E pros outros lhe aceitar.
Mais um monte de disfarces,
Ainda terá que usar.

Foram remendos, retoques e enxertos.
Uns a esconder suas vergonhas.
Outros, para parecer com seus pais.
Uns a esconder remendos antigos.
Outros, a substituir os que não combinavam mais.

Até que num belo dia,
Por pura curiosidade.
Trancado em seu banheiro,
Pra evitar cumplicidade.
E fixou-se no espelho,
Pra conhecer toda verdade.

Nem seu olho refletiu.
Tampouco, seu corpo encoberto.
Querendo poder, o original enxergar,
Cada uma das mascaras, decidiu arrancar.

Pra cada uma removida,
Tinha outra escondida.
Nosso herói desesperado,
Foi jogando todas de lado.

Foi com a última arrancada,
Que o espelho por fim revelou,
Que no banheiro não restava nada.

sábado, 12 de junho de 2010

A Andorinha - Alvaro Freitas

Oh tão perdida andorinha!
Que numa tarde gelada,
Por uma janela quebrada,
No escritório adentrou.

Quisera ser como eu!
Que num passado distante,
Em uma caçada errante,
Pelo umbral internou.

Oh tão ligeira andorinha!
Por entre setores diversos,
De chefes tão adversos.
Em poucos segundos passou.

Quisera ser como eu!
Ouvir, calar, engolir,
Inclusive, de tudo sorrir.
Teria ficado bem mais.

Oh tão astuta andorinha!
Que por todos convidada,
A partir em retirada,
Mas a ninguém se entregou.

Quisera ser como eu!
Apesar de enxotado,
Muitas vezes humilhado,
Nunca o posto entregou.

Oh tão ofegante andorinha!
Voando de lá para cá.
Deixou-se por fim apanhar,
Pelas garras da opressão.

Quisera ser como eu!
Fôlego das entranhas tirado,
Sem nunca parecer cansado,
Nem tampouco se entregar.

Oh tão derrotada andorinha!
Que das mãos do opressor,
Foi exposta sem louvor,
E pela janela atirada.

Quisera ser como eu!
Que sem conhecer o destino,
Nem tão pouco o assassino,
Ignoro a janela a porvir.

Oh tão livre andorinha!
A voar sem atropelo,
Nem lembrar do pesadelo,
Que um dia afrontou.

Quisera ser como eu!
E ainda no pesadelo estar,
Para quiçá um dia acordar,
E ver que a vida lá perdeu.

Oh tão invejada andorinha!
Se um dia ler esses versos,
Leia pelos anversos,
E perdoe a ignorância minha.

Se lhe servir de consolo,
Saiba que esse mesmo tolo,
Já se encontra bem cansado,
E num cantinho acuado,
Aguardando uma boa alma,
Pra da janela também me atirar,
E quem sabe poder te encontrar,
Na viagem a caminho do sol.

quinta-feira, 10 de junho de 2010

O SORRISO DE PELÉ

Aquela era uma manhã ensolarada de 1963. Havia chegado a poucos dias e estava morando num sobrado da rua José de Alencar, atras do campo do Santos. Saí para caminhar e depois de algum tempo resolvi cortar o cabelo. Ao percorrer a rua Princesa Izabel, passando em frente ao estádio, vi uma placa de barbearia, ao lado do bar que fica na esquina. Na frente um ponto de taxi, onde alguns motoristas jogavam dama em um banco de madeira para passar o tempo.
Entrei e uma pessoa estava terminando de cortar o cabelo.
Logo que saiu o barbeiro olhou para mim como dizendo. -Você é o próximo.
Ocupei a cadeira e em silencio ele começou a cortar meu cabelo.
Não havia se passado muito tempo, quando percebi uma agitação e os motoristas se dirigindo a um jovem que acabara de chegar.
Um deles quase obrigou o rapaz a sentar naquele banco para jogar dama. Mas, ele entrou na barbearia e cumprimentou com um sorriso. Olhou para o barbeiro dizendo.
-Quando chegar minha vez avisa. Ele quer perder de novo.
O motorista sentado no banco, colocando as peças no lugar chamava.
-Vem Pelé? Vamos jogar que hoje vou ganhar.
Ouvindo aquele nome, olhei para o jovem. O rapaz sorridente era Pelé.
Naquela epoca não havia ainda televisão em minha região. Então ouvia pelo radio os jogos do Santos e ele sempre pareceu um gigante. Mas, ali de chinelos e bermudas, não tinha nada de diferente dos outros jovens. Sorrindo e brincando com os motoristas, não parecia nem de longe o atleta consagrado. Já havia participado de duas copas do mundo e era considerado o maior jogador do momento. Mas, em minha frente era somente um garoto risonho, brincando sem nenhuma ostentação.
A partida terminou na mesma hora que o meu corte de cabelo. Pelé ganhou e seu oponente não se conformava. Pediu que depois de cortar o cabelo sentasse para jogar de novo. Enquanto eu saía da cadeira, ele se aproximou e ainda sorrindo disse.
-Tanta insistencia para perder de novo, parece até o Corinthians, não ganha uma de mim.
Cedi o lugar na cadeira também sorrindo e olhei na direção do motorista que aguardava ansioso para jogar novamente. Sai dali imaginando que seria novamente derrotado.
Aquela foi a primeira vez que vi Pelé. Desde esse dia, sempre que possivel acompanhava os treinos do Santos. Assistia a quase todos os jogos e ficava encantado com aquela máquina fantástica de jogar bola comandada por ele.
O tempo passou, ele foi para o Cosmos, nos Estados Unidos e um dia deixou de jogar futebol.
Nunca mais vi Pelé, mas ele nunca perdeu o contato com o Santos.
Nesse ano de 2010, aconteceu mudança de diretoria e conseguiram trazer Robinho, de volta por empréstimo. O estádio estava lotado quando ele chegou de helicóptero. Desceu e foi conduzido por Pelé até o palco armado no estádio, para apresentar a torcida.
Naquele momento Robinho era o rei, alvo das atenções. Os jornalistas queriam ouvir o que tinha para dizer. Mas, no meio daquela gente, pude percebe aquele mesmo Pelé.
Em sua simplicidade, conversava com todos e sorria alegremente.
Mais velho como todos nós, mais ainda conservando aquele mesmo sorriso de menino, dos tempos do futebol arte que ele foi rei.

Jafortes - Falcão Peregrino

domingo, 6 de junho de 2010

Teoria da Evolução - Alvaro Freitas

Foi no primeiro dia, quando Deus acordou.
Os céus e a terra, Ele criou.
O dia foi duro, mas enfim se acabou.

No segundo dia o labor perdurou.
Planetas e estrelas, o céu povoou.
E um universo de cores, Ele contemplou.

A terra está seca, o demais alagado,
Ervas e plantas, no chão semeado,
E o terceiro dia se viu, então encerrado.

O dia, da noite separado.
O dia raiou pelo sol alumbrado,
E a treva chegou, declarando o quarto dia acabado.

Os seres marinhos e as aves do ar,
Iniciaram que a vida vinha povoar.
Até o quinto dia, por fim se acabar.

Foi no sexto que o homem surgiu,
E junto com ele a mulher coloriu.
E sobre tudo que havia, seu império emergiu.

Uma idéia na mente,
Uma terra escavada.
Uma chama ardente,
Uma obra forjada.

Tendo o ferro surgido,
Da pressão e calor.
Pra ajudar a lavoura
E o bom caçador.

Ferramenta potente,
Na caçada abundante.
Fez o trabalhador contente,
E o guerreiro arrogante.

Pobre destino da terra,
Que depois de forjada,
Foi parar numa guerra,
Sem nunca ser convidada.

Quisera a arma, ferramenta promovida.
Nunca ter sido envolvida, em tragédia sangüinal.
Quisera o homem, semelhança de Deus concebido,
Nunca ter evoluído, para semelhante animal.