Esse blog foi criado pelos alunos do professor Ricardo para divulgar os rascunhos literários.
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quinta-feira, 20 de maio de 2010

SER OU NÃO SER ENGANADO

SER OU NÃO SER ENGANADO
-Moço! Ei moço! Posso falar um instante com você?
Caminhava distraido pela rua Guaibê em Santos, quando ouvi aquela voz me chamando.
Parei e olhei para ele. Era um homem de meia idade, devia ter uns 38 anos, estava com a perna engessada do tornozelo até acima do joelho e caminhava com dificuldade. Aproximou-se dizendo.
-Sabe! Tive alta na Santa Casa e minha familia não foi avisada. Consegui chegar até aqui, mas moro em Vicente de Carvalho e não tenho dinheiro para pegar a barca e atravessar o canal.
-Será que você pode me ajudar?
Olhei em seus olhos e achei que falava a verdade, então dei os três reais que carregava no bolso. Agradeceu com um sorriso e segui meu caminho. Estava indo visitar uns parentes ali perto, na Rua Jurubatuba. Chegando lá não encontrei ninguém em casa, eles tinha saido. Então retornei pelo mesmo caminho. E passando em frente a padaria que fica no meio da quadra, proximo onde aquele homem me abordou, senti a raiva tomar conta de mim.
Encostado no balcão com um copo de bebida à frente, lá estava ele.
O homem da perna engessada.
O sangue subiu, senti vontade de ir lá brigar por ter mentido para mim. Mas, acabei me controlando e seguindo para casa. Aquilo me aborreceu muito, então prometi que nunca mais ia deixar ninguém me enganar.
O tempo passou e um dia estava em Florianopolis onde mora minha filha. Levei-a para uma consulta médica. Ela entrou no consultório e eu estacionei o carro na sombra de uma árvore. Fiquei ouvindo musica e com a porta aberta enquanto aguardava. Estava ali a algum tempo, quando surgiu um casal, não sei vindo de onde. O pai com a criança nos braços aproximou-se e mostrou uma receita perguntando se eu podia dar algum dinheiro, pois a criança precisava tomar aquele remédio. Em minha cabeça veio a lembrança do homem que me enganou em Santos e comentei que devia ir no posto de saúde que conseguia o remédio de graça. Ele disse que tinha estado lá e aquele medicamento não havia em estoque, tinha que ser comprado.
Disse que não tinha dinheiro e pude sentir o desanimo em seu rosto. Saiu sem dizer nada, seguido pela mulher. Ainda não tinha virado a esquina, alguns metros a frente, quando comecei a sentir uma sensação estranha. Era como se minha consciência cobrasse. Afinal, aquele remédio podia ser a diferença entre a vida e a morte para aquela criança.
Não era preciso comprar o remédio, bastava dar algum dinheiro. Ele ia ficar satisfeito e eu não ia ficar mais pobre. Então liguei o motor do carro e fui atrás deles. A rua que entraram era contra mão, tive que dar uma grande volta e com isso perdi muito tempo para chegar onde imaginei que estariam. Mas, não havia nem sombra deles. Rodei pelas imediações, e nada. Depois de algum tempo resolvi voltar e minha filha já estava me esperando. Perguntou onde tinha ido. Respondi que fui resolver um negocio mas não dei maiores explicações.
Voltamos para casa e fui pensando naquela criança. Será que agi certo? Tenho visto campanhas para não dar esmolas e que remedio a rede publica fornece. Mas, tem hora que temos a sensação de estar sendo cruel com as pessoas, como aquele chefe de familia com aquela criança. Pode estar desempregado e sei que na rede pública falta medicamentos. Fiquei com um peso grande na consciência e decidi que devo ser mais criterioso e analisar com calma para não ser enganado. Mas, sei também que as vezes é melhor arriscar para ajudar quem precisa, que virar as costas para todos.

JAF Falcão Peregrino

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