José Oraculano da Silva, operador de circuito fechado de televisão. Conte um pouco do seu trabalho para os nossos telespectadores!
—Pode me chamar de Zoráculo, todos me conhecem assim. E eu sou operador de Cê-Fê-TV. Eu gosto que chamem meu trabalho pelo nome certo. A gente tem que valorizar o nosso serviço.
Certamente! O senhor se orgulha do que faz?
—Mais é claro que sim. Em todo esse prédio, eu sou o mais importante. Sou eu quem julga o certo do errado. Se não fosse por mim, quem faria justiça?
Ufa! Essa eu não entendi. Explica essa de certo e errado.
—O outro dia veio um morador e falou: “Deixa eu ver a gravação da câmera da garagem do dia tal”. Espera ai moleque. Não é assim não. Aqui tem regras e o Zoráculo aqui tem responsabilidades.
E o que você fez.
—Saquei o formulário e falei: “Preenche ai mano! Num esquece de nenhum campo! Aqui, aqui e aqui.”
Ai você mostrou a gravação?
—Claro que não. Num sô “utubi” pra ficar mostrando filminho. As gravações são confidenciais. O que foi filmado, só eu posso assistir. Se alguém quer saber de alguma coisa, me explica o motivo e eu conto o que houve.
Não é mais fácil mostrar o filme?
—Lógico que não, Mané! Amadores! Vocês não foram treinados para interpretar corretamente o que está gravado. Se o Cê-Fê-TV filma um casal se beijando por exemplo. Ai chega a patroa do cara querendo saber o que houve, eu logo digo: “Num foi nada, só um cumprimento de vizinhos.” E tudo termina bem. “Capiche”?
E se for o marido da moça?
—“Mano, a vagabunda tá te botando chifre!” — “Com quem? Fala que eu mato!” — “Nunca vi o cabra no prédio!”
Espera aí! Isso é injusto!
—Tá questionando a minha autoridade! Num viu a minha farda não? E isso aqui que eu levo na cinta?
A lanterna?
—É muito mais do que uma lanterna. Esse é o meu símbolo de poder. No escuro sou eu quem dá as regras. Sou eu quem indica o caminho certo e deixa o errado no escuro.
Tudo bem, desculpa. Eu só não estava entendendo.
—Por isso que você é repórter e eu Operador de Cê-Fê-TV.
E nos casos simples?
—Aqui quem decide o que é simples e o que não é sou eu. E no meu prédio, não tem caso simples!
Um carro riscado por uma bicicleta na garagem. Se você olha a gravação e vê a filha de um morador arranhar a porta do carro do outro. Isso é simples.
—Depende do carro. Depende do morador. Depende da menininha. Só quem pode julgar sou eu. Pois eu tenho todas as imagens.
Como assim, depende do carro?
—I-30, puta dum carrão. Tem mais é que se ferrar. Sai por ai dando uma de galã e acha que todo mundo tem que desviar e pedir licença.
Fusca!?
—Conservadinho?
É!
—O pai da guria tem que pagar cada centavo. O cara dá um duro pra comprar o carango, lava, cuida, tudo original. Ai vem uma filhinha de papai, riquinha desgraçada e risca. Tem que pagar!
Isso não é certo!
—O senhor vem me entrevistar. É bem recebido e agora vem me ofendendo.
Eu não te ofendi, eu só disse que...
—Eu tenho provas das suas agressões. Está tudo gravado!
Então me mostra a gravação.
—Preenche o formulário. Em quarenta e oito horas eu te respondo se falta alguma informação e em setenta e duas horas eu lhe dou o veredicto.
Direto do Edifício Imperador para o “De olho na Notícia”.
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