Esse blog foi criado pelos alunos do professor Ricardo para divulgar os rascunhos literários.
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segunda-feira, 26 de abril de 2010

Vitrine

Quando pequena minha família sofria de constantes crises financeiras, éramos sete irmãos, todos em posição de dependência dos pais. Meu pai viajava sempre a procura de melhorias para a família e nos ficávamos em casa com mamãe. As vezes ela me levava para passear, visitar uma prima que tinha loja de roupas no centro da pequena cidade onde morávamos. Eu ficava observando as vitrinas onde eram expostas lindas roupas. Em um desses passeios me enamorei de uma saia amarela, godê e prinçada, sem a menor possibilidade de possuí-la.
Em casa comentei com mamãe sobre aquela paixão, que tanto me incomodava, segundo ela nada poderia fazer por mim. Mesmo criança sabia da situação de meus pais, fato que me fez sofrer silenciosamente. Visitar a prima de mamãe virou meu passa-tempo preferido. Acredito que fissurada naquela saia nem percebia o quanto me fazia mal aquelas voltinhas pela cidade. Mudamos, o tempo passou, eu cresci, mas a imagem daquela saia jamais esqueci.


Hoje mamãe já morreu.
Não ficará sabendo que em minha vida existe uma saia.
Nem tão pouco quero que escutem-me os impuros:
mamãe foi mais breve em minha vida do que uma saia.
A saia e eu!
Moraremos na vitrina para sempre.
Ela exposta e eu fissurada nela.
Uma coisa temos que aceitar,
conseguimos façanha insuperável,
morar para sempre em um mesmo lugar.
Se não fosse minha infância paupérrima,
eu não teria como hospedes: uma vitrina,
uma saia godé,
amarela e prinçada.
Mamãe estava tão branca e fria,
não tive coragem de confessar que,
quase fui destruída por uma saia.
Almejada com tanta dor pela minha meninice!

2 comentários:

  1. Vera, que legal. Você se superou. Amei.

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  2. Vera, você conduziu-me de volta a minha infancia também pobre onde um sapato era meu fascinio, pois andava descalço. Acho que muitos viveram alguma esperiência parecida. O Alvaro está certo, voce se superou.

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